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sábado, 6 de abril de 2013

DITADURA, NÃO!

OPINIÃO POLÍTICA

Por: Gerson Nei Lemos Schulz
Prof. universitário de Filosofia

"Não sou favorável a qualquer tipo de ditadura, 
seja de 
'direita', seja de 'esquerda'. 
Ditadura, não!"




Nessa semana, alguns círculos comemoram o golpe militar orquestrado por um grupo de oficiais do exército brasileiro na madrugada do dia 31 de março para o dia 1° de abril de 1964. Esse grupo era contrário ao governo, em estilo populista, do presidente João Goulart. Também, de acordo com documentos secretos norte-americanos, liberados em 2004 pelo "The National Security Archives", dos E.U.A, o golpe teve amplo apoio dos Estados Unidos, por meio de seu embaixador aqui no Brasil, Lincoln Gordon. Os norte-americanos liberaram dinheiro e montaram uma operação chamada "Brother Sam" que disponibilizou uma frota (pronta para invadir o Brasil) e apoiar o golpe - golpe este que os militares insistem em chamar de "revolução", coisa que não é - porque uma revolução é a mudança radical da cultura, da estrutura política, econômica e social, algo que não aconteceu no Brasil que já havia sofrido a ditadura civil-militar do governo Vargas. 

De acordo com o documentário de Flávio e Camilo Tavares - "O dia que durou 21 anos", Lincoln Gordon enviou dezenas de relatórios para Washington, para alertar sobre o "perigo" de se formar um governo comunista no Brasil. Perigo que só existia, na época, na fantasia de lideranças da igreja católica e de poucos círculos militares, tanto que o golpe começou em Juiz de Fora - MG, uma cidade periférica do centro de poder das decisões nacionais. Jango poderia ter esmagado o movimento, mas preferiu fugir para o Uruguai. Questões como: "ele fugiria se sentisse que, de fato, tinha apoio para implantar aqui um regime socialista?" Ou: "caso sentisse que tinha consigo o apoio incondicional dos poucos movimentos sociais da época, não teria ele, Jango, dado o "golpe" comunista como alguns temiam? Além disso, inclusive, Jango tinha o apoio de boa parte dos oficiais do exército na ocasião, (do Brigadeiro Rui Moreira Lima; do Comandante do III Exército, José Machado Lopes; do Sr. Ivan Proença, oficial da Guarda Presidencial e etc.), especialmente no que tangia às reformas de base, como a reforma agrária (que até hoje presidente algum realizou com competência no Brasil) que poderiam levar o país, a médio prazo, a uma posição econômica respeitável.

Como professor de filosofia não posso aceitar uma ditadura de qualquer natureza, nem, supostamente de "direita", como foi no Brasil, Chile, Argentina; como é em Myanmar; Arábia Saudita - onde a mesma família está no poder desde 1932 -; Angola; Irã - que na prática é liderada pelo poder teocrático - ou Zimbábue. Nem, supostamente, de "esquerda" como ocorre em Cuba, Laos, China, Coréia do Norte. Assim, penso que o golpe de Estado de 1964 é uma mancha vergonhosa na história do Brasil. Supressão de liberdades, torturas, prisões, condenações sem julgamento, assassinatos, atos Institucionais da idade da pedra - especialmente o AI-5.

Mancha porque, na época, as forças armadas e policiais foram usadas por um grupo de pessoas que as viam como vassalos acéfalos dentro da hierarquia militar. Em qualquer país civilizado onde o exército já se profissionalizou, as forças armadas sabem que não são feitas para comandar governos. Que são feitas para servir ao povo e não massacrar seus próprios compatriotas desarmados! Será que a hierarquia militar subordina o sujeito a "não pensar por si", tornando-o "acéfalo"? Será que se os militares subalternos pudessem pensar, naquela ocasião, não teriam - em sua maioria - impedido o disparate de seu comandante, Olímpio Mourão Filho, de marchar até o Rio de Janeiro?

Na Alemanha atual é expressamente proibido tocar o hino do partido nazista, o hino da juventude hitlerista, fazer qualquer menção direta ao nome de Hitler e usar ou divulgar símbolos nazistas pela Lei N° § 86a StGB. O mesmo se dá no Brasil quanto ao nazismo, no texto da Lei Nº 9.459, de 13 de maio de 1997, em seu Artigo 20, § 1º. O nazismo não ocorreu no Brasil, não tivemos holocausto, mas tivemos torturas, violação dos direitos humanos e, usando palavras de hoje, terrorismo de Estado, por que, então, não lançar aqui uma lei para proibir a comemoração do golpe de 1964, bem como seus símbolos, como faz a Alemanha democrática atualmente? A Alemanha faz isso para garantir seu futuro como nação no mundo civilizado, a participação efetiva de seus cidadãos e a liberdade individual. Não devíamos proibir aqui também qualquer menção positiva ao 1964?

Condenar o golpe militar de 1964, e qualquer outro, é dignificar a democracia e consolidá-la.
É falacioso o argumento que diz que fazer isso é antidemocrático porque um golpe de Estado, necessariamente, assassina a democracia quando impede a maioria de expressar o que pensa, pois a democracia é para a maioria, não para um grupo. Então, embora com limitações, dentro de nosso modelo democrático, é lícito, sim, abafar o pequeno grupo que comemora o golpe. Como é também lícito publicar e julgar os crimes cometidos naquele período, pois até hoje há famílias que não enterraram seus mortos, assassinados por militares daquela época. Além de civis, há também militares que foram assassinados naquele período por se opor ao regime.
Seria uma omissão do poder público negar ou esquecer tais crimes assim como é uma omissão dos militares de hoje não revelarem os crimes cometidos, caso tenham em seu poder algum documento ou informação sobre o paradeiro de vítimas. Do ponto de vista moral, ético e do Direito, torturador deve ser punido, não importando a idade que tenha, porque continua sendo criminoso. Cabe ao Estado, por meio de seu poder judiciário, investigar e esclarecer os fatos.

Em respeito às vítimas de 1964, este texto é curto, pois as imagens a ele vinculadas falam mais que mil palavras e condenam todos aqueles que ainda insistem em apoiar um golpe.
Nada contra os militares de hoje - que não tomaram parte naquilo - mas os de 1964 sempre serão lembrados com indignação e como fantoches manipuláveis e acéfalos. O golpe de 1º de abril foi dado no dia dos bobos! Bobo foi quem acreditou que derrubando Jango, estava defendendo o Brasil e que Castelo Branco cumpriria a palavra que deu, ao dizer - no Congresso - que defenderia a democracia, entregando, depois de passada a crise, o poder de volta aos civis, algo que ele nunca fez, como provou a história. 
Quem ganhou com o golpe? Alguns oficiais, os Estados Unidos da América, os grandes investidores estrangeiros, cujas empresas lucravam aqui até 900%. Já o militar da "base", o soldado sem estrelas que teve que cumprir ordens e fazer o "serviço sujo", ficou "a ver o navio da história a atropelá-lo".

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

O QUE É UMA TESE?


Por: Gerson Nei Lemos Schulz


CUIDADO: ESTE ENSAIO CONTÉM PERGUNTAS IMPRÓPRIAS PARA AQUELES QUE TÊM CERTEZAS ABSOLUTAS E FÉ INCONDICIONAL NAQUILO QUE FAZEM NO ÂMBITO DA EDUCAÇÃO.










A pergunta do título foi feita outro dia para o autor deste texto em função de que ele tenta escrever uma tese, mas sem estar plenamente convencido que isso tenha alguma importância além de engordar o currículo Lattes no CNPq. A resposta dada foi a seguinte ao interlocutor: "a minha tese é como uma amante: penso nela todos os dias, durmo com ela, sonho com ela, mas nós não nos amamos!"


A resposta foi irônica porque essa pergunta não é fácil de responder. Caso fosse, certamente não renderia tantos livros e discussões e nem seria alvo de seminários que duram semestres inteiros nos cursos de pós-graduação das universidades do Brasil e do mundo.

A Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT – diz que este tipo de trabalho é um trabalho técnico e que deve ser inédito. Não há limites de página para realizá-lo. E, nos diferentes cursos universitários, elas diferem muito. Por exemplo, é possível que se escrevam teses de mil e setecentas páginas como uma que está na PUC de Porto Alegre e outras bem menores, com duzentas ou cento e poucas páginas. Tudo depende da natureza do curso e do assunto tratado.

É também possível que em doutorados de Matemática se escrevam teses de vinte páginas (nesses casos geralmente elas contêm apenas cálculos), ou na área de agronomia em que um aluno doutorando pode acompanhar um processo como, por exemplo, o experimento de uma nova ração para frangos por determinado tempo e verificar, medir, qual o efeito dessa ração na postura das galinhas.
Parece que não há uma receita para determinar o que é uma tese, apenas pode-se diferenciá-las. Mas o objetivo desse texto é comentar sobre as teses na área da educação e é aí que é difícil! Fica difícil porque atualmente se fala muito na "crise da educação", mas essa crise que a academia em geral fala não é o fato de o governo, por exemplo do RS e de mais 12 estados, não pagar o piso salarial (e essa é uma crise concreta que em muitos casos impede a sobrevivência do professor).

A suposta crise que a academia sofre, e sofre sozinha porque não a divulga muito, (pois onde essa discussão encontra espaço em programas populares no rádio ou televisão?) é outra, é uma crise epistemológica. Isso é mais complicado! Complicado porque essa crise o professor da escola básica (que tem que cumprir seu plano de curso, complementar horários organizando festinhas para angariar fundos para o caixa da escola, fazer serviço de secretaria e até de faxineiro) dificilmente toma conhecimento.

O professor que está na "raiz" do sistema escolar/educacional precisa transmitir o que ele sabe ou o que o livro didático determina porque os pais querem que seus filhos sejam aprovados no vestibular e a direção da escola não quer perder as verbas governamentais, fato que ocorre se o número de reprovados ou evadidos for alto.
 
Grosso modo a crise epistemológica é essa: como provar que o método dialético é melhor porque dá mais amplitude que o método funcionalista? Ou que a hermenêutica é melhor que a fenomenologia? É possível escapar do teor ideológico dessas posturas metodológicas?
O mal-estar se dá quando o pesquisador, seguindo o atual modelo de ciência (que é Moderno), percebe que já tem as respostas prontas em sua mente e apenas consulta a realidade, recortando-a para caber em suas categorias. É isso que o renomado prof. pelotense Jandir Zanotelli chama de "cortar o pé para caber no sapato".
Em outras palavras, dá um mal-estar perceber que passar meses se condicionando, deixando de fazer outras coisas mais atraentes para escrever um trabalho desses é produzir um texto que apenas dirá ao mundo (aos pares porque a tese dificilmente sai do âmbito acadêmico!) a sua singela "opinião bem fundamentada" sobre algo. Isso fica evidente na área de história da educação em que uma pessoa se preocupa em narrar "coisas esquecidas" pelos outros. E quando dois ou mais pesquisadores discordam sobre a interpretação de um terceiro, cria-se uma tarefa inglória (saber a verdade), já que nenhum dos envolvidos poderá jamais conhecer a verdade daquilo que discutem nem mesmo se utilizarem o método mais rigoroso!
Quanto as teses em filosofia da educação (hoje) o que são elas? Que prática é essa de dissecar determinado autor defendendo-o contra tudo e contra todos os opositores? - E ainda há doutores que se prestam para defender até mesmo os preconceitos dos filósofos medievais. Tudo em nome da exegese!

Extraem-se dos autores até mesmo aquilo que eles jamais podem ter querido dizer em vida!
E diferentemente, quando nessa área se produz algo realmente original, em um país agrário como o Brasil, o mal-estar é saber que as ideias, fruto de um esforço enorme, não terão efetividade alguma talvez nem a longo prazo, pois que filósofo, educador, pedagogo  é convidado pelas Comissões Parlamentares (Senado e Câmara) para dar o ar de sua graça na formulação das leis educacionais? Que teses de filosofia da educação os senhores Senadores e Deputados leem para fazer suas propostas?

Mas e os métodos! Análise de conteúdo, análise de discurso, ambas estão na moda e, infelizmente, ambas são confundidas com a mesma coisa. Mas se Olabuenag e Ispizua (OLABUENAGA, J.I. R.; ISPIZUA, M.A. La descodificacion de la vida cotidiana: metodos de investigacion cualitativa. Bilbao, Universidad de deusto, 1989.) estiverem certos, nem análise de discurso ou de conteúdo são métodos, pois derivam da hermenêutica (embora sem muita certeza) classificada como método porque vem desde a Antiguidade, desde Platão, inclusive. Então elas são técnicas de interpretação, apenas.
E ainda tem a lógica! Até o século XIX pensou-se que a lógica formal era perfeita e estava plenamente desenvolvida (Kant diz isso em sua 'Lógica'). Mas G. Frege e B. Russell mostraram que essa proposição era falsa. Surgiu aí a lógica matemática com notações simbólicas e com a possibilidade do cálculo proposicional que pode mostrar, com cálculos, as falácias do discurso e criar uma linguagem completamente nova. Isso permitiu o surgimento dos computadores.
Os positivistas e neopositivistas adoraram, pois a partir daí seria possível determinar de uma vez por todas "exatidão" nos conceitos das ciências humanas. Isso valeu até surgir o II Wittgenstein com seus "jogos de linguagem". Ele concebeu elementos para fazer refletir que mesmo que um leão falasse inglês não entenderia nada do que um londrino dissesse porque não entenderia os contextos de fala. A lógica também é uma interpretação!

Mais uma vez se esvaiu o sonho de muitos filósofos em construir a unificação das ciências, e de uma vez por todas, enrijecer os abalados pilares das ciências humanas, especialmente da Filosofia e da Pedagogia. Hoje se tem, com Newton da Costa (um brasileiro renomado fora do Brasil), a lógica paraconsistente, uma lógica que mostra que a lógica matemática também não é plena, pois ainda apresenta contradições em universos distintos!

Fora do âmbito lógico, já no âmbito da teoria do conhecimento em educação, Marx, Nietzsche e Freud tinham lançado severas dúvidas sobre o que é ou deve ser educar alguém. A pergunta que fica das leituras desses filósofos é: "que significa educar alguém?" "Para que educar?" "Que autoridade alguém pode ter para educar outrem?" "Qual a legitimidade da escola?

Por exemplo, dirá Freud: como a escola alemã clássica (uma das melhores do mundo em termos de qualidade de ensino) pôde produzir homens que se odiavam tanto na I Guerra Mundial e pessoas capazes de cometer as maiores atrocidades sem a mínima reflexão? É preciso acrescentar que Freud não viu o fim da II Guerra e, especialmente, o que os alemães (que encarnaram o nazismo) fizeram com os judeus. Até mesmo um filósofo (hoje clássico) como Heidegger aderiu ao nazismo convictamente.

Outro golpe veio nos anos 1960 com os franceses Bourdieu e M. Foucault que abalou ainda mais a educação. Ambos demonstraram que ela não passa de mera intervenção ideológica de outrem, o adulto sobre um "incapaz", a criança. Eles questionaram e derrubaram "certezas", princípios de segurança, alicerces da Filosofia e também da Pedagogia com perguntas como: "o que é ser normal?" "Quem garante que os valores reproduzidos pela escola são parâmetros de normalidade?" "Que garantias há de que a cultura ocidental é sadia para ser ensinada a uma criança?" "Que autoridade alguém tem para punir uma criança caso não obedeça essa cultura ocidental?"

A crise é não ter respostas convincentes para esclarecer: "que sentido tem escrever hoje uma tese na área da educação?" "Que relevância tem apresentar uma tese (enquanto proposta original de novos rumos para a educação) à sociedade brasileira se a própria universidade ainda segue um modelo departamentalizado que é herança do Golpe de 1964?" "Se até a escola pública segue padrões mercantis que condicionam a liberdade de pensamento?" "Qual curso de Pedagogia hoje no Brasil tem algo relevante a dizer para o professor que está no 'front' da escola pública ganhando 'salário de fome'?" "Qual curso de pós-graduação nesse país faz pesquisa de ponta em educação e cujas pesquisas (dissertações e teses) conseguem superar a mera descrição de situações empíricas que ocorrem no cotidiano da escola?" "Que valor tem tais descrições/teorizações acadêmicas para os professores que realmente as vivenciam no cotidiano da escola?"
 
E mais: "que relevância existe no fato de um pesquisador se ultraespecializar em determinado autor ou apenas em uma das fases da vida intelectual deste e passar sua vida acadêmica inteira preocupado com o critério CAPES de produtividade 'endeusando' seu 'papa'?" "Que sentido existe em uma pessoa fundar dentro de um departamento de universidade uma 'igreja' para 'cultuar' autor A ou B e estabelecer daí, com outras 'igrejas', um embate insano na luta por recursos, bolsas, fomento, poder, prestígio?"

Estes são os critérios de normalidade acadêmica? É seguir e obedecer este critério que dá autoridade (que autoriza) um mestre ou doutor a educar uma criança e puni-la caso ela não queira seguir o modelo? É nessa autoridade que se funda o alicerce daquela instituição que se organiza dentro de um prédio cercado, com deveres e poucos direitos, obrigatório pelo Estado, com professores (pseudocarcereiros mal pagos, destreinados, empobrecidos) a transmitir a "cultura"?
Escola, lugar em que,  por outro lado, os alunos (pseudo prisioneiros) se rebelam não contra o sistema porque nem o percebem mais, mas contra seu próximo (também condicionado, o professor: esfaqueando-o, estuprando-o, matando-o) e cada vez mais amparados por uma legislação opaca como o "ECA"; ou a "LDB" que não foi elaborada por "autoridades" da área da educação, mas por políticos (boa parcela preocupados com cargos e em atender setores que financiaram suas campanhas) leigos no assunto.
Diante de tudo isso os autores de teses deveriam se perguntar: o que querem com isso? Seu trabalho será mais um a figurar nas estatísticas do Ministério da Educação para que os governos possam justificar ao Banco Mundial que estão gastando com a educação (que nunca é vista como investimento)?

E será a tese destes autores mais uma a empoeirar nas prateleiras das bibliotecas? A ficar à disposição nos sites de pesquisa de domínio público que é consultado por apenas minoria dos brasileiros?

Essas perguntas o autor deste trabalho se faz todos os dias desde que se tornou mais um gerúndio (doutoraNDO) nas estatísticas do MEC sem encontrar respostas. Será que é por causa de perguntas assim que aumenta a cada dia o número de professores doentes e alcoólatras?

Carpe Diem!



sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

PAULO FREIRE INSIDE OUT


By Gerson Nei Lemos Schulz









One of  pupils´ concerns  is the evaluation of learning. They have asked: is it fair to evaluate? Many educators have answered “no” and they rely on Paulo Freire (1921-1997) in order to justify that assertiveness. 
Freire being Carl Marx´ s reader confessed to be post-modern, though not without references, according to Gomercindo Ghiggi, PHD in education, professor at Federal University of Pelotas, in Pelotas city in Big River of South State, Brazil, who wrote a doctoral thesis about him. Freire believed that to alphabetize is not to be “charitable” with fellow creatures and to teach  them the letters mechanically  is to allow  the fellow creatures to be free. But what kind of freedom did he talk about?

Freire  believed that in order to be free one ought to have conscience of his own responsibilities. For this reason to know how to read and write, according to what he states in "Pedagogia do Oprimido" [The Pedagogy of the  Oppressed One], is not sufficient. Therefore that is just the beginning  in order to learn to tell his own history. The Freirian  proposal  is  not  a system, as states Gadotti   (História  das  Idéias  Pedagógicas  - 2005) [History of the Pedagogical Ideas - 2005]. It is the fight of classes inside schools. Freire  replaced  the concepts of Marx´ s bourgeois and proletarians by oppressors and oppressed  citizens. Notwithstanding he does not want that the oppressed citizens and the laborers become oppressors, he wants that the oppressors themselves  also become aware that they have oppressed.


Nevertheless, it is necessary to keep in mind  that when we read Freire, one should not romanticize him. Although the common sense believes that he advocates the suppression of evaluation, that would turn to a hurried reading. Freire criticized the Positivist School. For him  there is a mere reproduction  of the dominant, capitalist ideology on it and the evaluation is the oppressive instrument that reproves the least “capable”. Even so, he also states in “Conscientização” [Understanding] that the laborer, if he wants to adopt a capitalist posture, he may, as soon as he can choose it.  That is the reason why Freire defended understanding as a first step for the social emancipation.

Freire is right when he verifies that the child with the access to a good breakfast,  a good lunch and also having means of learning, he or she  will have a better profit than the child who has a lack of it.  But it is worth remembering that he has not   proposed a formal school. On the contrary, his proposal was to be executed in any place where people have interest  to learn.  Yet, in formal schools the evaluation exists as a form of quantifying and qualifying learning. Thus, the evaluation does not  seek to judge a person, but to verify  the pupil´ s  proficiency  in comparison to what the teacher has taught. On the other hand, if the evaluation is ignored  as long as a process  as to know who has re-signified the content? To leave the pupils to interpret knowledge according to his opinion is not to leave them in common sense, just where schools want to take them out?


Finally, though without confronting the controversy, I stand with Demo (Mitologia da Avaliação, 2002) [The Mythology of Evaluation, 2002], who states that the negation of the evaluation classificatory score  implies to ignore the school context. And this happens when one avoids to evaluate because it is also to evaluate. For him, to release the evaluation that everybody is  equal in society and this is the most authoritative evaluation  that exists. That is why I always ask myself together with Massetto (Docência na Universidade, 2005 [Teaching at  University, 2005]: what do my pupils need to learn in order to become professional citizens at the present time?  Surely they should not read Freire inside out.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

PLATÃO E O MITO DA CAVERNA


Gerson N. L. Schulz



É na obra "A República" que Platão (428-347 a.C) nos contempla com uma das mais famosas passagens da literatura ocidental, chamada a "Alegoria da Caverna". O personagem central da história é Sócrates (470-399 a.C.).

Sócrates nos convida a imaginar um grupo de homens que, desde o nascimento, estão acorrentados a uma rocha em uma caverna. Assim, eles acreditam que tudo o que pensam, dizem e ouvem é natural. Como seus antepassados sempre viram e pensaram o mesmo, para eles a tradição tem todo valor.

Dentro da caverna, estes homens não podem nem sequer virar o pescoço para os lados. Toda a realidade que conhecem não passa de projeções de imagens numa parede ao fundo da caverna, mas eles não sabem disso, pensam que, o que veem, é a verdade.

Atrás deles, sem que o saibam, há uma fogueira queimando eternamente, e, entre a fogueira e os acorrentados, passam outros homens. Estes realmente livres, carregando toda sorte de objetos e conversando entre si. São as imagens desses objetos projetados na parede, ao fundo da caverna, e os ecos das vozes de quem passa, que os acorrentados veem e acreditam ser a realidade. Eles não desconfiam que haja objetos sólidos além das sombras que enxergam, ou palavras claras e distintas além de ecos que ouvem. Tal cenário, como afirma Marilena Chaui, em sua obra "Convite à Filosofia", lembra a sala de um cinema.

Sócrates (pela letra de Platão) diz que os homens que moram na caverna vivem "felizes", porque vivem na ignorância. Eles distribuem prêmios entre si a quem adivinhar qual será a forma do próximo objeto a surgir na parede, ou a quem tornar inteligíveis os ecos. Mas, Sócrates convida, num segundo momento, a imaginar que um destes homens consiga se libertar das correntes. E, olhando para trás, perceba o que acontece. E vê também que é possível escapar da caverna.

Lá fora, após subir pelas paredes escarpadas, diz Sócrates, provavelmente o ex-acorrentado ficará temporariamente cego com a luz solar. Aos poucos, é que vê as cores, a natureza, o céu e a luz do sol. Talvez fique maravilhado com aquela "verdadeira realidade". Sócrates diz que este homem nunca mais sentiria inveja dos prêmios ganhos por aqueles que adivinhavam o que eram as sombras projetadas nas paredes da caverna. Nunca mais sentiria falta das riquezas que não ganhara, quando dentro da caverna, porque perceberia que tudo aquilo que os outros pensavam ser real, era falso.

Sócrates disse que uma vez livre, se fosse um homem de compaixão, o recém liberto se apiedaria dos companheiros acorrentados lá dentro da caverna e voltaria, a fim de alertá-los sobre as maravilhas que avistara do lado de fora. Porém, quando entrasse na caverna, imaginou Sócrates, primeiramente a escuridão o cegaria, mas aos poucos é que ele voltaria a ver.

Mas Sócrates traça um cenário sombrio àquele que escapou da caverna, ao afirmar que, de volta, junto aos companheiros, após ter dito a eles tudo o que viu e ouviu fora da caverna, seria odiado e morto. Sócrates diz que seus próprios amigos, familiares, esposa ou filhos afirmariam que estava louco, que era mentiroso por tentar destruir o "mundo real", no qual estavam mergulhados e, por isso, o matariam por ousar duvidar de todas as crenças, da cultura, de seus valores construídos e herdados dos antepassados, e com os quais e pelos quais viviam desde que crianças.

Para Japiassú (2001) em uma alegoria, os personagens são a personificação de ideias e não de pessoas reais. O objetivo da "alegoria da caverna" é questionar sobre as crenças, a cultura, os valores e as verdades que a sociedade impõe a todos, como se elas pudessem ser eternas e imutáveis.

Os valores morais da sociedade são perfeitos? O deuses existem? A fé deve se sobrepor à razão? A razão deve sobrepor à fé? A razão humana é ilimitada? A verdade existe? Deve-se obedecer sem questionar? Quem garante a autoridade das autoridades?

Ninguém, para Sócrates, deve aceitar ideias prontas, ordens sem questionamento, autoridade autoritária, juízo sem valor, valor sem juízo!

Por quê? Pergunta que todo aquele que quer ser filósofo deve fazer. É condição sine qua non para todo ser humano que quer construir sua liberdade de pensamento.

No fim da "alegoria", Sócrates conta qual o caminho que aquele homem usou para escapar das correntes. O caminho é a educação. Por isso, se aprende com Sócrates, que a educação é primordial para qualquer homem ou mulher que queira ser livre do engano, da aparência e das ideias falsas, do erro e da ignorância.

REFERÊNCIAS

JAPIASSÚ, Hilton. MARCONDES, Danilo. Dicionário de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.

PLATÃO. República. Lisboa: Gulbenkian, 1993.

REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da filosofia: Antiguidade e idade Média. 6. ed. São Paulo: Paulus, 1990.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

SEMINÁRIOS CATÓLICOS PARA QUÊ?



Texto dos professores

Gerson N. L. Schulz Jones Talai

*Ex-seminaristas


Hoje se tem discutido muito sobre novos paradigmas educacionais na pós-modernidade. A pós-modernidade é caracterizada pela fragmentação de saberes e por discursos que tentam se validar pelo poder das mídias. Diante disso, há a necessidade de se buscar uma educação que seja inter/transdisciplinar, que fomente o pensamento crítico, que busque o diálogo com os diversos saberes da sociedade, que tenha abertura às novas possibilidades de conhecimento e que, ao mesmo tempo, possua segurança acerca de seu próprio método educativo e consistência epistemológica.

Ora, diante deste cenário, gostaríamos de refletir o que representa hoje os seminários teológicos da Igreja Católica, espaço onde há uma atividade pedagógica. Os seminários surgiram no séc. XVI como reação à Reforma Protestante. O espírito presente nesta realidade histórica original era o de uma ideologia totalitária que se tentava firmar como única verdade/realidade absoluta diante dos reformadores. Assim, pela educação, se pensou conter o avanço do Protestantismo na Europa.

Destarte, estes centros se constituíram como núcleos apostólicos que pretendiam formar homens capazes de levar adiante a fé católica. Desde então os seminários procuram formar sujeitos capazes de manter a imutabilidade de sua doutrina, mas que, muitas vezes, nesta tentativa heróica, falham escandalosamente quando se trata de formar pastores e homens de fé, justamente por não considerar a mutabilidade mundana e sua historicidade.

Por causa deste conservadorismo, a Igreja, como um todo, está se desvinculando do mundo real, não conseguindo acompanhar suas mudanças. Do mesmo modo produz pessoas deficientes para estabelecer diálogo com o mundo não-católico ou secularizado, ou ainda com o povo simples que se diz capaz de pastorear. Assim, os padres forjam um tipo de conhecimento que os distancia da linguagem coloquial e não os capacita sequer para entrar em diálogo com a comunidade científica. Seu saber tornou-se próprio de uma casta sacerdotal. Dentro disso, os seminaristas de hoje perderam o método epistêmico dos clérigos antigos e medievais e ficaram apenas com seu ranço conservador. Se há poucos anos os padres que eram formados no rigor da Escolástica, sob a maestria lógica de Tomás de Aquino, se perguntavam qual a validade de estudar o Tomismo, os seminaristas atuais (epistemologicamente perdidos) perguntam: o que é o Tomismo?

Portanto, até que ponto os seminários com esta proposta pedagógica poderão educar seus estudantes para o sacerdócio? E será que a ignorância intelectual dos neo-sacerdotes não comprometerá o edifício eclesial construído pelos "nostálgicos gerontocratas" da Igreja?

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

DEMOCRACIA, MONARQUIA OU DITADURA?


Gerson N. L. Schulz


ATENÇÃO: se você é uma pessoa que não consegue dialogar com a opinião alheia e pensa que palavrão é argumento, não leia este texto. Ele é para pessoas inteligentes e não para você que, na falta de argumentos, só sabe grunhir.


Diante das crises políticas e da corrupção atuais no Brasil, ouço algumas pessoas alardeando em filas de ônibus, de banco ou no mercado que "na época da ditadura era melhor". E outras ainda dizendo que o Brasil deveria voltar a ser uma monarquia.

Opiniões a parte, me pergunto "por que algumas pessoas dizem tais coisas se nas épocas das ditaduras e da monarquia também havia corrupção. Sabe-se hoje que no período em que os militares comandavam o Brasil, a corrupção também existia; ela era apenas velada, escondida e a imprensa não podia dizer nada além daquilo que o regime deixasse. Pergunto-me também: "por que alguns querem de volta uma forma de governo anacrônica que já faliu historicamente em nosso país e que hoje foi superada por aqui, como é o caso da monarquia?

Alguns dos maiores descalabros brasileiros ocorreram na monarquia: tomada abrupta das casas legítimas dos colonos por D. João VI, exploração da riqueza das Minais Gerais com ônus para a colônia, escravidão indígena e africana, cobrança de impostos pela Coroa Portuguesa cuja pecúnia era investida no exterior e não aqui, invasão da Guiana Francesa, do Uruguay, destruição quase total do Paraguay, as guerras separatistas em função dos descontentamentos com a monarquia e a tirania do Imperador. No campo econômico, apesar da abertura de um dos maiores patrimônios do país, o Banco do Brasil, o mesmo D. João o defenestrou quando de seu retorno a Portugal, além da perseguição política ao Barão de Mauá, cuja visão progressista e empreendedora tinha grande possibilidade de por o Brasil dentre os países mais ricos do mundo. 

É por isso que, para aclarar essas discussões, esse artigo propõe uma reflexão sobre o tema e trata dos tipos de governo. Quais são? Como são?

De acordo com o dicionário de filosofia de Nicola Abbagnano, o historiador Heródoto pergunta: "Como poderia ser um governo bem instituído se apenas um só homem governasse? Se ele pode fazer o que quer sem dar satisfação a ninguém? Por isso, segue Heródoto, o monarca tende a tornar-se tirano".

Assim, contrariamente, o governo do povo (democracia) é o melhor, diz Heródoto, porque neste tipo de governo todos são iguais. Em contrapartida, este também tende a degenerar e a tornar-se desenfreada demagogia, com o tempo. Então, na conclusão do filósofo, "a melhor forma de governo é uma boa monarquia".



Platão, por seu turno, diz em "A República", que a aristocracia (governo dos melhores, no caso platônico, o dos filósofos) é o melhor. Mas adverte que a aristocracia pode degenerar em timocracia, isto é, no governo fundado na honra que nasce quando os governantes se apropriam de terras e das casas de outrem.

A outra forma de governo é a oligarquia. Um governo baseado no patrimônio, no qual apenas os ricos governam.

A quarta forma é a democracia, na qual a todo cidadão é lícito fazer o que quer. Mas o tipo extremo de degeneração política é a tirania, que pode nascer da excessiva liberdade da democracia, segundo ele.

Assim, é na obra "O Político", que Platão distingue três formas de regime político: o governo de um só; o governo de poucos e o governo de muitos.

Essas formas, segundo sejam regidas por leis ou desprovidas de leis, motivam respectivamente o governo tirânico, o governo aristocrático e o governo oligárquico, e as duas formas da democracia: a regida por leis e a demagógica.

Vamos pensar sobre os dois casos citados na introdução do artigo, a monarquia e a ditadura?


A monarquia é hereditária, sendo assim, mesmo que um rei seja corrupto, ele não poderá ser substituído por outro cidadão, pois caso seja substituído (o que é muito difícil em uma monarquia) o será por um "nobre", isso quando não ocorrem disputas familiares motivadoras de guerras civis como a que houve com Pedro I quando deixou o trono brasileiro para lutar pelo reino de Portugal contra seu irmão, Miguel, em 1831.


No Brasil, antes de sua partida definitiva e de sua morte na Europa, Pedro de Alcântara criou os Poderes Legislativo, Executivo, Judiciário e Moderador (quatro poderes). Na prática de nada valeu essa divisão, pois todas as decisões do Parlamento, do Senado e da Justiça, tinham que ser aprovadas pelo Poder Moderador (que era exercido pelo Imperador) e o permitia se intrometer nas decisões dos outros Três Poderes.

Além de ser uma figura autoritária, tendo em vista suas violentas reações contra os opositores, Pedro de Alcântara também fechou a Assembleia Constituinte em 1824 por discordar de seus pares liberais, que ele mesmo convidou para redigir a Constituição.

O detalhe é que aqueles seus convidados eram somente grandes proprietários de terras escravagistas, grandes comerciantes e homens letrados. O povo brasileiro de fato (camponeses, jornalistas, artesãos, pequenos manufatureiros, pequenos comerciantes, pequenos proprietários) ficou de fora daquele projeto de poder. 

Em relação ao Parlamento dos Deputados, criado pelo Imperador, este era eleito para um mandato de quatro anos, mas quanto aos Senadores, estes eram vitalícios e o Poder Monárquico era hereditário. Na prática, o povo continuou excluído do projeto político brasileiro.

Logo, defender que esse modelo político é, hoje, o melhor para o Brasil se torna algo difícil, pois quem seria o rei brasileiro? Ele seria eleito? Seria aclamado? E se fosse aclamado, quem dentre todos os brasileiros goza de condições morais ilibadas, intelectuais e outras para ser o rei?



Ademais, a maioria das pessoas desejaria renunciar ao poder de livre escolha de seus candidatos aos cargos eletivos? Estaria a maioria dos brasileiros disposta a (na monarquia) se tornar súdito de um rei, sendo obrigado a "beijar-lhe" a mão como também dos "nobres"? Mesmo que essa monarquia fosse constitucional, teria a Constituição força para evitar os excessos dos Poderes, garantir direitos iguais a nobres e a não-nobres?

E a ditadura? Será que a democracia brasileira tornou-se completamente demagógica já que essa é a degeneração desse regime, como aponta Platão?

É esse o motivo pelo qual alguns cidadãos dizem que "na época da ditadura era melhor?"


O mundo tem muitos exemplos de ditaduras (tanto de 'esquerda' quanto de 'direita'). Sabe-se também que em nenhum lugar onde houve uma ditadura de qualquer natureza a sociedade que por ela é regida foi ou está feliz. E é sabido hoje por todos que a ditadura militar brasileira foi uma das piores formas de governo já adotados em um país. É sabido que houve mortes e perseguições a dezenas de cidadãos (operários, jornalistas, professores, médicos e etc. que discordavam do regime), controle de pessoas e instituições, censura artística, cultural e educacional. Houve abusos do governo central, ou seja, do Estado contra cidadãos e é tal fato que é alvo da crítica daqueles que não concordam com os regimes de exceção.

É nesse sentido que se diz que os militares têm até hoje uma dívida histórica com o povo do Brasil (pelo fato do Estado regido por eles ter cometido crimes contra seu próprio povo, dentre eles a obtenção de confissões sob tortura dos inquiridos) e também porque a ditadura expulsou do poder um presidente legitimamente eleito pela vontade popular!

Não é possível ignorar a falta de liberdade que viveu o Brasil entre 1964 e 1985 por causa do regime militar que teve como seus maiores símbolos os famigerados Atos Institucionais (dentre eles o AI-5).




É verdade que o Brasil ainda sofre o problema da corrupção, mas isso é motivo para condenar à morte o regime democrático? É só a democracia que sofre desse mal?

A democracia exige responsabilidade. Exige que as pessoas (a sociedade) faça sua permanente manutenção. E por isso não se deve esquecer, também, que quem elege os políticos é o povo. O poder de votar é garantido pela democracia que o Brasil vive hoje e, em boa medida, a causa da corrupção são alguns políticos eleitos e não a democracia. Como a democracia precisa de responsabilidade e interesse público para funcionar, a falta de compromisso de alguns eleitores que não investigam melhor seus candidatos também contribui para o surgimento da demagogia que é a degeneração da democracia.

Também há responsabilidade da Justiça Eleitoral (que ainda é morosa), há falhas de alguns candidatos que só pensam, como alertou Maquiavel, em conquistar o poder para usufruir dele para si mesmos e há problemas quando se observa a inexistência de mecanismos punitivos mais eficazes contra os maus políticos que se escondem sob a imunidade parlamentar

Enfim, a discussão não se fecha aqui mas dentre todos os modos de governo citados, faço um convite, se pergunte: qual deles permite maior grau de liberdade ao cidadão? Qual deles permite a alguém ou a algum grupo descontente com a situação, protestar contra esse mesmo regime? Protestar contra o governo? Qual desses regimes permite o impeachment de um líder? Qual deles aceita que pessoas das mais diferentes classes sociais tenham os mesmos direitos (ainda que, infelizmente, estejamos no Brasil longe da perfeição nesse quesito)?

segunda-feira, 23 de abril de 2012

NIETZSCHE CONTRA O CRISTIANISMO

Gerson N. L. Schulz



Nietzsche (1844-1900) propôs a "transvaloração dos valores" religiosos e morais quando denunciou que eles foram impostos pelos cristãos ao Ocidente após a queda do Império Romano. Por isso ele quer demonstrar que tanto a religião católica como a moral das igrejas cristãs são as responsáveis pela infelicidade do homem na Terra.

Na obra "O Nascimento da tragédia" de 1872, Nietzsche estabelece o ideal de homem para os gregos pré-socráticos. Aquele do período compreendido entre a Grécia arcaica e o século VI a.C. Este modelo é o homem da tragédia antiga.

Nietzsche identifica esse espírito antigo com Dionísio, o espírito da força e da saúde, da embriaguez criativa e da paixão sensual. Dionísio é o símbolo da harmonia do homem pleno com a natureza. Ao lado do dionisíaco estava também o apolíneo, ou seja, a visão do sonho e a tentativa de expressar o sentido das coisas na medida e na moderação, explicitando-se em figuras equilibradas e límpidas.

Mas Apolo e Dionísio viviam em constante conflito entre si na mente do homem grego e sua reconciliação também se dava de forma constante e era isso que mantinha o equilíbrio na civilização. Porém, para ele, a Grécia começou a se modificar quando, com Eurípedes, tentou-se eliminar da tragédia o elemento dionisíaco em favor dos elementos morais e intelectualistas (apolíneos). Então, segundo o autor, a luminosidade clara sobre a vida se transformou em superficialidade silogística. Aí apareceu Sócrates com sua "presunção" de compreender e dominar a vida com a razão e com isso também sobreveio a "decadência grega". Negaram-se os instintos que traziam consigo a força vital. O apolíneo, puro e simplesmente, foi manipulado pelos filósofos que estabeleceram a maiêutica como recurso de quem não tinha mais arma para lutar.

Segundo Nietzsche, Sócrates perverteu a juventude grega quando ensinou que os instintos deveriam ser controlados e aniquilados e que o corpo era mau e seus sentidos não importavam para o conhecimento, mas apenas a razão. É daí que Nietzsche afirma que toda moral ocidental, desde Sócrates até o cristianismo, foi e é um equívoco porque os moralistas pensaram que ditando regras estavam contribuindo para melhorar a humanidade quando, ao contrário, estavam fazendo-a decair ao estabelecer que se devia lutar contra os instintos vitais.

Para Nietzsche, Sócrates tomou força nas teorias dos órficos e estabeleceu uma crença num mundo de além ('espiritual' e 'superior') que rompeu as relações da humanidade com a própria Terra e com aquilo que existe de mais vital, a natureza. Essa pregação ao homem de que ele deve afastar-se do mundo buscando o "além" acarretou uma mudança nos paradigmas que influenciou todo o Ocidente. Ou seja, ao tirar o "centro de gravidade" da Terra e pô-lo no outro mundo, descentralizou-se a Terra."

O próprio Sócrates, afirmou Nietzsche, quis morrer ao não se defender diante dos juízes em sua condenação. Jesus fez o mesmo. Conclui Nietzsche que Sócrates e Jesus desprezavam os valores da Terra em prol de valores no além. E esse além não passa de quimera.

Esses dois personagens, segundo Nietzsche, são decadentes porque levaram a raça humana a acreditar que a vida na Terra não vale a pena de ser vivida porque é moralmente má e iníqua. Ao contrário, para Nietzsche negar este mundo é negar a vida.

Nietzsche, então, lança a "praga contra o cristianismo", subtítulo de sua obra "Anticristo", escrito em 1888. É nesse livro que, após severas críticas ao personagem "Jesus", Nietzsche acusa também o apóstolo Saulo de Tarso de ter pervertido o cristianismo original, é em relação a isso que Nietzsche ironiza afirmando que "o único cristão morreu pendurado na cruz".

Paulo teria então distorcido o cristianismo fazendo dele uma leitura universalista e de acordo com a ótica judaico-romanizada. Seu intento era espraiá-lo para outros povos esmagando as demais culturas, eliminando as diferenças características da Eurásia e tornando todos "iguais". Além disso, Nietzsche denuncia que os cristãos pensam que o cristianismo é a única "verdade" que existe. Na história quando isso aconteceu essa doutrina iniciou o combate a outros grupos, religiões, pessoas e Estados muito mais antigos. Saulo seria o responsável por essa versão pérfida porque é "castradora da vida", negadora das diferenças, que chegou a Roma e, consequentemente, à Europa.

Nietzsche ressalta também que Jesus jamais pregou a castidade, a negação dos instintos carnais, chama-o até mesmo de "inocente" porque pressupôs ingenuamente uma humanidade ideal, disposta a se moralizar. O cristianismo, então, não contaria que a negação da moral é justamente aquilo que permitia o funcionamento da estrutura social. Em outras palavras, Nietzsche faz menção à pergunta: "teria algum sentido o cristianismo existir caso não pensassem seus pregadores que o mundo está doente?"

A resposta de Nietzsche é "que não teria sentido algum". O cristianismo e os cristão pensam que o mundo está "doente", corrompido, mas adverte Nietzsche que pensar assim já é emitir um juízo de valor, então é mera opinião. É a vontade de que o mundo esteja doente que faz o cristão atuar e pensar, ao agir, que sua ação é a mais correta dentre todas. Isso, se infere, é um grande engano porque o mundo é assim como é, nem bom, nem mal. Não há nenhuma doença nele. Essa doença é uma invenção assim como é invenção o conceito de cura.

Nietzsche põe em xeque as noções de "pecado original" e a ideia que afirma que a humanidade está "doente". Para Nietzsche isso é falso, não há pecado original algum. Nietzsche ironiza perguntando: "que deus louco é esse que cria um doente e depois lhe oferece a cura apenas se o doente amá-lo?"

Assim Nietzsche esvazia de sentido o cristianismo, pois não havendo pessoas que acreditem que são más por natureza, não há necessidade alguma da existência do cristianismo.

Por isso ele prega o fim do cristianismo, essa é sua "praga contra o cristianismo". Mas essa religião é também má à medida que leva as pessoas a se acharem culpadas pelo mal no mundo. O sentimento de culpa, para Nietzsche, é a causa da submissão e da ignorância. Quando alguém se sente culpado, quer a "cura" da culpa e a cura é oferecida pelos "pregadores da moral".

Nietzsche não discute se "deus" existe ou não. Ele aponta o engano que há daqueles que consideram os padres como "libertadores" do povo. Os únicos responsáveis por espalhar a culpa sobre a humanidade são os padres (inclusos também os pastores cristãos). E são os padres e pastores, enquanto intérpretes dos textos religiosos, que mantêm o poder de controlar as pessoas. Nietzsche conclui que eles, juntamente com o cristianismo, são os verdadeiros algozes da humanidade que, falsa e hipocritamente, se passam por "libertadores".

domingo, 1 de janeiro de 2012

FELIZ ANO NOVO!


 Por Gerson Nei Lemos Schulz


Há "realmente" algo de diferente no encontro das 24 horas do dia 31 de dezembro com a zero hora do dia primeiro de janeiro?

Nada que também não haja nos demais dias do ano. Mas simbolicamente muitas pessoas costumam encerrar uma etapa de sua vida e, também simbolicamente, iniciar outra nesse momento.

Fazer promessas, simpatias (como se diz no Brasil), ouvir presságios e premonições de adivinhos e oráculos é uma prática também comum em nossos dias, mesmo além da Revolução Francesa que estabeleceu os estados nacionais como os conhecemos hoje, das duas Guerras Mundiais e de toda tecnologia que está a nossa disposição isso ainda é comum.

Parar de fumar, fazer regime para emagrecer, parar de beber, terminar um relacionamento amoroso ou se casar podem ser as promessas mais comuns e também as que menos são cumpridas. Mas isso mais parece um ritual do que garantia de efetividade de que isso acontecerá, pois dizer ou prometer tais coisas sempre é uma tentativa, ao que me parece, de auto-determinar sua própria existência, de manter a consciência de que ainda se pode exercer alguma liberdade sobre o tempo que escorre e sobre si mesmo!

Tempo. Quem não gostaria de controlá-lo? Quem não gostaria de ignorar que a cada ano novo que passa significa que estamos aqui (e quantos já são os que não estão mais?), mas também quer dizer que estamos mais perto daquele dia em que não estaremos?

Paradoxo? Não. Ao mesmo tempo em que estamos vivos, também estamos caminhando, à medida que vivemos, para o fim de nós mesmos, esse é um dos inescapáveis determinantes da condição humana!

Mas voltando a falar de decisões ou promessas que costumamos fazer, gostaria aqui de ampliar a voz de um texto de Zygmunt Bauman (44 Cartas do Mundo Líquido Moderno, Zahar, 2011) que versa sobre anos novos e seus fantasmas. Diz ele (p. 128-9) que há promessas que não podemos deixar de cumprir, fala ele especialmente daquelas que dizem respeito sobre ações para evitar ou diminuir o aquecimento global e suas consequências em geral.

Ele nos lembra que esse fenômeno já aconteceu na Terra há 250 milhões de anos e que a temperatura do planeta subiu 10 graus. Naquela ocasião a causa foi uma erupção vulcânica que liberou dióxido de carbono na atmosfera e, posteriormente, por causa desse aquecimento, "acordou" as grandes massas de gás metano que estavam no fundo dos mares levando-os para a atmosfera. 95% das espécies foi extinta e as que sobraram sofreram as consequências disso pelos duzentos anos seguintes.

Ressalta Bauman que dessa vez a causa tem nome: raça humana. Esse cenário do passado poderá voltar mas dessa vez não por causa de erupções vulcânicas, mas por causa das ações irracionais de todos nós!

Indiscriminadamente o homem tem aterrado o mar (no Brasil isso aconteceu em lugares como Rio de Janeiro e Florianópolis), poluído indiscriminadamente o ar e as águas (algo que já nos parece 'natural', afinal são poucas as pessoas que até hoje não devem ter visto alguma vez na vida uma chaminé expelindo fumaça para os céus) já que, segundo o Departamento de Energia dos Estados Unidos da América, entre 2009 e 2010 houve um crescimento de 6% nas emissões de gases do efeito estufa.

Outro fator grave é a degradação florestal que, no caso do Brasil, no período de agosto de 2010 a julho de 2011, aumentou expressivamente em 241% conforme diz o pesquisador Paulo Barreto do www.imazon.org.br.

Ficam as perguntas: o que estamos efetivamente fazendo para mudar isso? Estamos pressionando nossos governos para criarem políticas públicas que facilitem a reciclagem do lixo e o seu não acúmulo junto a córregos e nascentes? E eu, o que estou fazendo com todo o lixo que produzo? A madeira que compõe minha escrivaninha tem origem em reflorestamento?

Não é novidade que os sinais da natureza estão em toda parte. São os solos congelados há milênios no Alaska que se derretem afundando as casas sobre eles construídas; a temperatura que aumenta nos estados do Norte do Brasil; o buraco na camada de ozônio; os ciclones extratropicais que atingiram o país nos últimos anos; as estranhas baixas temperaturas para a época de verão no Rio Grande do Sul entre o Natal e o Réveillon de 2011/2012.

Considero essas, com diz Bauman, questões que não podemos mais deixar para discutir no outro réveillon sob pena de não haver outro, pelo menos não para a raça humana! Feliz ano novo para você, para os seus e para mim também, assim espero!

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

A FILOSOFIA PRECEDE A EDUCAÇÃO?



Gerson Nei Lemos Schulz

Texto originalmente publicado na Revista Conhecimento Prático Filosofia N. 29 - Abril de 2011 da editora Escala
www.conhecimentopratico.com.br/filosofia


Até hoje é questão de debate a pergunta: "quem surgiu primeiro: a Filosofia ou a Educação?" defendo que desde o dia em que o homem olhou a sua volta e se perguntou: o que é a vida? Para onde se vai após a morte? Por que as coisas queimam? Nasceu a filosofia.
Com o passar do tempo e a organização dos homens em tribos e cidades, isso graças à sistematização do conhecimento sem o qual não teriam conseguido sair de sua vida nômade, surgiu a educação. Moacir Gadotti diz (História das Idéias Pedagógicas), que a educação pré-histórica era oral e passada de pai para filho na família. Educação era práxis. Aprendia-se a usar o arco, usando-o. O aprendizado de um indivíduo era voltado à resolução de problemas do cotidiano. Por não haver escolas, a educação não era burocrática.
Mas foi na Grécia que apareceu a filosofia enquanto ciência de altos estudos e também a escola. Os filósofos produziam conhecimento, mas o ensinavam na escola. Então indagar sobre a natureza das coisas era praticar filosofia enquanto atividade de busca de respostas (sistematização) aos fenômenos do mundo, e educação era ensinar saberes. Um exemplo da influência da filosofia sobre a educação é a crença geocêntrica de Aristóteles (322 a.C.) que só foi desfeita em 1609 por Galileu. Isto quer dizer que, por 1931 anos o mundo conhecido acreditou que a Terra era o centro do sistema solar. Isso era, inclusive, ensinado em todas as escolas ocidentais.
Quanto à filosofia, pode-se afirmar que Homero (autor da Odisséia) atribuiu ao Ocidente um modelo de homem (antropologia), uma ética (a dos heróis) e um berço (as origens da Grécia) e Hesíodo contribuiu com a Teogonia, modelos que foram ensinados geração após geração na educação Ocidental.
De acordo com Giovanni Reale (História da Filosofia), Tales de Mileto (VII a.C.), reconhecidamente o primeiro a questionar a origem de todas as coisas, mudou para sempre a história da educação. Pitágoras (530 a.C.) também fundou uma escola de Filosofia que tinha um fundo místico e religioso (crença na reencarnação das almas) e na "perfeição" dos números (depois desmistificada pela descoberta do número irracional). Mas foi Platão (427 a.C.), fundador da Academia, um dos mais influentes pensadores do mundo Ocidental, pois em sua escola surgiram alguns princípios da universidade. Outros nomes como Agostinho, Tomás, Montaigne, Marx, Nietzsche, Foucault, também deram sua contribuição para nortear as atividades da educação ao longo da história.
Para concluir, outra influência da filosofia sobre a educação: se Comte (1798) pensou o Positivismo com a escola centrada na autoridade do professor e avaliações tradicionais; Foucault (1926) mostrou que esse modelo de escola é semelhante à prisão porque os alunos são controlados por inspetores e professores e há avaliações que nem sempre mostram quem sabe mais, e podem funcionar como mecanismo de cooptação. Logo, se pensar precede ensinar, a filosofia precede a educação.