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segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O QUE É O NATAL?

Gerson N. L. Schulz



Todos os anos, para aqueles que acreditam no cristianismo, esta época é para se refletir sobre o ano que passou, sobre a vida, sobre o que se fez e para onde se quer pilotar a nau da existência, como afirma o filósofo Platão (428-347 a.C) no Fédon.

Claro que Platão não era cristão nem poderia ser, pois o cristianismo ainda não fora "inventado". Segundo o filósofo Giovanni Reale, em sua História da Filosofia (1991), Platão, apesar de ser um grande divulgador das capacidades racionais do homem (que os gregos chamavam 'Logos'), dava fundamental importância ao mito que para ele não era fantasia, mas expressão de fé e crença. Para Platão o mito é a fé racionalizada. O mito procura clarificação no Logos e o Logos busca complementação no mito, segundo Reale.


Ao analisar esta frase pode-se inferir que Platão reconhecia os limites da razão e também que, de fato, há coisas que ela não pode explicar. Por isso confiava ao mito esta capacidade, isto é, o mito é aquela explicação poética, impossível de ser comprovada, que às vezes foge completamente da realidade conhecida cogitando a existência de outra que não se pode ver.


Entretanto, no caso do natal, essa concepção não se aplica, pois o natal não se trata da gênese dos deuses gregos nem da escatologia, suposta, após a morte. O natal é uma data muito improvável reconhecida sua improbabilidade pela própria igreja que o criou, o cristianismo católico. Caso Cristo realmente existiu (é bom lembrar que a ciência história até hoje não confirma sua real existência, nem a autenticidade das narrativas contidas nos chamados evangelhos), dificilmente teria nascido em vinte e cinco de dezembro. Esta é uma data convencionada porque ninguém sabe ao certo se a personagem principal da festa realmente existiu, quanto mais sua natalidade.


O natal como se conhece hoje é uma invenção do mundo católico medieval. A bíblia também não confirma a identidade dos reis magos e nem que eram três. Provavelmente se Jesus nasceu ele não veio ao mundo em uma manjedoura como se diz, mas em uma estalagem à entrada de uma cidade como era comum na época.

Não é objetivo aqui discutir os pormenores desta história "mal contada" porque nela sobram lacunas para preencher, por sinal. Porém, nunca se teve a notícia depois dos relatos dos evangelhos sobre uma estrela que anda e pára como hipoteticamente era a que guiava os magos do Oriente, segundo Mateus. Algo assim não poderia ser uma estrela!




Para finalizar este texto crítico sobre o natal (que penso ser mais comércio que religião, mais trabalho/exploração dos comerciários que ficam nas lojas em pé, com fome, atendendo uma massa exigente, quando não mal educada, faminta pelos produtos da moda, ávida por cacarecos que estarão imprestáveis daqui a um ano), - e como  fazem sucesso aquelas bugigangas fabricadas por mão-de-obra escrava na Ásia - só resta dizer: é natal de novo "e o ano novo já vem…", como diz a canção...

AMOR OU PAIXÃO?

Gerson N. L. Schulz




Foi em um domingo à noite em que eu estava na orla da cidade de Macapá, próximo de um bar com música ao vivo, que presenciei uma cena triste: um casal de namorados brigando. Enquanto ela dava sapatadas nele, ele se defendia argumentando que não a tinha traído. A partir disso nada melhor do que refletir sobre o amor e a paixão. O que é amor? O que é paixão? Há diferença entre ambos?


Para a filosofia clássica, nascida do seio da Grécia antiga, era possível se cultivar o amor. Mas ele não era um ser vivo, embora pudesse morrer. E, conquanto, se possa morrer de amor, como em "Romeu e Julieta", ainda assim o amor é entidade metafísica. A paixão, não obstante seja manifesta, também é.

A herança grega nos deu cinco tipos de amor. O amor ágape, um tipo de amor que ficou mais conhecido com o advento do cristianismo por ser o amor que o deus judaico-cristão sentiu pela humanidade, criando-a; por pura gratuidade já que Ele é perfeito e não precisaria da humanidade para nada. Os outros tipos são bem mais humanos. Em segundo tem-se o amor filia, aquele que pais e filhos sentem mutuamente, designa também o amor entre amigos. Em terceiro há o amor eros, aquele amor que desperta a paixão, é o amor que aproxima dois seres, desencadeando uma série de sensações agradáveis. Mas este não é passageiro como a paixão.

Platão
Em quarto e quinto estão o amor platônico e o amor pornéia. O amor platônico (em filosofia) não é o mesmo que no senso-comum. Ele significa amor ao belo, às formas, é amor do intelecto. É amor que não usa os sentidos. É por isso que no senso-comum se diz que é o amor em que os amados nunca se tocam.

Há ainda o amor pornéia, de onde deriva pornografia. O pornô é aquele amor que não tem compromisso algum. É o sexo feito com a garota ou garoto de programa. Onde o que importa é a relação sexual para satisfação imediata.

Quanto à paixão, é Aristóteles (384-322 a.C.) quem trabalha melhor esse conceito evidenciando que ela é pathos (de patológico). A paixão é algo que subtrai a razão. Domina a ação. Por isso alguns crimes se dizem passionais, em função de que o indivíduo sofre a ação de seus próprios instintos e estes dominam sua vontade que perde a liberdade.

Por fim, a paixão se diferencia do amor na medida em que é puramente carnal, irracional, não é ato de uma vontade livre, é fruto do desejo (embora para a justiça isso não retire a responsabilidade). O conceito amor envolve também noções de moral, ética, preservação, fidelidade (não necessariamente conjugal). A capacidade de amar parece constituir parte do intelecto humano, pois mulheres e homens amam-se a si mesmos mas não se apaixonam por si mesmos. Então a paixão constitui-se em pathos, algo anormal que pode se confundir com o amor. Porém, é claro, nem sempre ela é negativa, às vezes ela causa bem estar, ainda que momentâneo. Já o amor está ligado à ideia de continuidade na relação, de querer estar junto, de transcendência do sexo.

CONHECER É PODER?

Gerson N. L. Schulz




Representação do
Filósofo Pitágoras
Nascido por volta de 500 a.C na cidade de Metaponto (ao sul do que hoje é a Itália), Hipaso de Metaponto era membro da escola dos Pitagóricos. O filósofo Pitágoras era de Samos e em 530 a.C vivia o apogeu de sua vida pública como o chefe da Escola dos Pitagóricos. Suas doutrinas elementares afirmavam que os números eram o princípio de toda ordem no universo, consequentemente, o universo havia sido criado por uma entidade racional. Para Pitágoras a música (na qual ele determinou as relações harmônicas de oitava, quinta e quarta), era a linguagem matemática universal.


Além disso, como todos os elementos da natureza podiam ser associados às figuras geométricas, acreditava que a natureza era constituída por números, mas não simplesmente pelos numerais como conhecemos hoje (abstratos) e sim, para Pitágoras, os números eram entidade reais, materiais e racionais. E era por meio dessa racionalidade que o universo era mantido.

O problema surgiu quando o discípulos Hipaso de Metaponto, trabalhando sobre as relações métricas no triângulo retângulo, pôs em dúvida a ideia de que todos os números eram racionais. Partindo da descoberta de seu mestre de que, em um triângulo retângulo qualquer, o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos catetos, Hipaso se perguntou: e se os lados do triângulo retângulo medirem 1? O que acontece? Realizando o cálculo ele descobriu que a hipotenusa teria o valor da raiz quadrada de 2. E isso era gravíssimo, ou ele tinha errado os cálculos ou nem todos os números do universo eram racionais. Ele estava certo, tanto que Pitágoras o proibiu de contar a quem quer que fosse esse segredo, pois Pitágoras acreditava que se alguém soubesse da existência de números irracionais, o mundo e toda a humanidade seriam destruídos.

Mas Hipaso não só contou a outras pessoas, como escreveu um livro sobre o assunto. O fato é que, até hoje, sua morte, logo após a publicação do livro, permanece mistério. Ao que se sabe ele se afogou ao atravessar, juntamente com outros companheiros, um rio. Mas a história mais comum é de que ele foi afogado como punição por ter revelado o segredo dos números irracionais.

Refletindo-se a infeliz história de Hipaso de Metaponto, pode-se concluir que nem sempre conhecer é poder. Lamentavelmente, quando o conhecimento abala a fé das pessoas, suas crenças ou quando é manipulado ou falsificado, ele não liberta ninguém e pode até causar a morte. E quem paga por isso é o cientista que é, por vezes, perseguido porque suas descobertas chocam os paradigmas conservadores que determinada sociedade costuma propagar como sua "verdade". Assim como Hipaso foi assassinado, assim também na idade Média os cientistas eram queimados pela inquisição católica, na Modernidade (como foi por anos o caso de Charles Darwin, Pasteur, Tesla e outros tantos), eram vítimas de chacotas ou morriam na miséria sem ter o que comer.

Concluindo, e na Pós-modernidade, o cientista e o filósofo recebem o destaque que merecem ou se continua pensando que eles e suas idéias não passam de histórias? Pode ser que nem sempre conhecer seja poder, mas na maioria dos casos o conhecimento mudou a história da humanidade para sempre.