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domingo, 21 de dezembro de 2014

MAURÍCIO TRAGTENBERG: ANARQUISMO PEDAGÓGICO E PEDAGOGIA LIBERTÁRIA





PROF. GERSON NEI LEMOS SCHULZ
(CO-AUTOR E ORIENTADOR)

ACADÊMICAS DE PEDAGOGIA

ADRIANA REGINA DE OLIVEIRA MENDES
MARIA HELOISA CORREA MACHADO
MIRELE DA SILVA DUARTE
VANIA MARA DA COSTA BORGES

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE
FURG





Este artigo trata da Pedagogia Libertária proposta pelo pensador anarquista Maurício Tragtenberg (1929-1998), nascido em Erexim, neto de imigrantes judeus que se instalaram no interior do Rio Grande do Sul. Nessa cidade Tragtenberg começou seus estudos e, posteriormente, foi para um grupo escolar em Porto Alegre. Naquela cidade ele conta, em suas memórias (1999), que não foi além da 3° série do primário. Seus problemas com a escola formal começaram ainda no primeiro ano quando foi reprovado nas aulas de canto. Na década de 1940, ao ficar órfão de pai, foi com a mãe para São Paulo onde cresceu e, na idade adulta, começou a trabalhar e se filiou ao Partido Comunista Brasileiro de onde foi obrigado a se desligar mais tarde vindo a dirigir assim o recém-formado Partido Socialista Revolucionário. Maurício Tragtenberg se fez conhecer nos meios acadêmicos como autodidata e como "socialista libertário".

De forma geral, podemos dizer que suas influências teóricas vêm de autores como Marx, Bakunin, Kropotkin, Malatesta e Lobrot (GADOTTI, 2005, p. 261). Tragtenberg, dentre os pensadores com influencia marxista/anarquista da contemporaneidade, destaca-se por se preocupar com a escola, instituição a qual fez críticas por seu modelo pedagógico burocrático, críticas essas sob inspiração de Max Weber (1864-1920), chegando à teoria da pedagogia libertária também de inspiração foucaultiana (Michel Foucault, 1926-1984); traçando as relações primárias de poder entre professores, alunos, funcionários, direção e orientadores que seriam uma reprodução das relações de poder e submissão na sociedade, ideia esta mesclada com as teorias da escola reprodutivista de Pierre Bourdieu (1930-2002).


Tragtenberg dizia que a prática de ensino reduzia-se à vigilância e a escola burocrática seria uma forma de controle da população escolar onde o aluno seria apenas um receptor submisso de conhecimentos e o professor seria o dominador. A burocracia, segundo ele, perverte as relações humanas, causando conformismo e alienação (outra ideia que não é dele, mas de Karl Marx, 1818-1883), assim ele mostra uma nova possibilidade, a de luta por meio da organização das classes sociais submissas, com a participação do trabalhador em geral na vida política e em especial do trabalhador em educação, visando uma reeducação dos mesmos.


Tragtenberg discutiu sobre as várias faces de dominação existentes na escola, desde a simples disposição da mobília atentando para o detalhe que o professor sempre fica(va) acima dos ouvintes em seu "púlpito" ou tablado e os dóceis e submissos alunos em suas carteiras dispostas umas atrás das outras, assemelhando-se a sala de aula a uma linha de montagem. Tragtenberg denuncia o mecanismo em que o professor "julga" o aluno nos conselhos de classe que equipara a um grande tribunal de "presos" ou "criminosos" em que o aluno é julgado pela nota que lhe atribuem e, como resultado de tal julgamento, às vezes recebe uma pena severa que pode lhe trazer reflexos para o resto da vida profissional e pessoal, ou este mesmo processo pode, antes da vida adulta, levá-lo à exclusão da escola, instituição esta que serve ao sistema capitalista em geral, segundo ele.

O filósofo comparava a escola aos presídios (assim como também Foucault) afirmando que a prática da "disciplinação" é uma herança do sistema carcerário, especialmente porque a vigilância permanente e os registros sobre os alunos (notas, presenças, observações, boletins, históricos e etc.), bem como o uso de uniformes-modelo classifica rigorosamente os indivíduos.

Para superar tudo isso ele propugnava a "Pedagogia Libertária" que almejava desenvolver o processo de aprendizagem por meio da "autogestão" dando à comunidade escolar (e ao local em que o indivíduo se desenvolve que pode ser o bairro, o trabalho e etc.) o poder de gerir todo o processo ali decorrente.

O objetivo central era que cada indivíduo alcançasse sua autonomia e se tornasse um "ser digno" apesar de viver em um meio social materialista em que tudo e todos têm um "preço". Para ele o homem não pode ser tratado como mercadoria, pois tem sua dignidade. Por isso ele era contra premiações ou punições valorizadas na sociedade contemporânea e a favor da solidariedade fundamentada na abolição da competição e na crítica a todas as normas autoritárias.

Por fim, após esse breve corolário, entendemos que Tragtenberg advoga que somente desse modo ocorrerá a democratização da escola e que esta democratização virá depois que houver a desvinculação entre poder e saber. Momento em que professores, alunos e funcionários formarão uma só comunidade democrática e "libertária". Porém, analisamos que o desafio maior é desvincular a escola (seja ela qual for, até mesmo a universidade) da ideia de mercado de trabalho, de atribuição de notas, de punições ou louvores a alunos e hoje também aos professores e funcionários, e ainda assim "transtornar" a atual relação de poder que possa existir entre docentes e discentes – em outra perspectiva – como o professor não exercerá "poder" (o poder do saber) sobre o discente se o discente ainda não está de posse do saber docente? Não acreditamos que o docente tudo saiba, mas é coerente afirmar que o discente que se candidata à escola pretende, nela, "adquirir" conhecimentos que não tem condição de aprender sozinho. Que outra forma ou formas de indicar quantitativamente o aproveitamento de um aluno em determinado curso, senão por meio de notas ou conceitos? Apesar de Tragtenberg demonstrar que as provas só provam que o aluno é capaz de repetir o conteúdo que sabe "de cor", que outra forma de "separar" quem "sabe" de quem "não sabe"? (E admitimos que separar já é classificar esse alguém, mas lembramos com Pedro Demo – 2002 – que não avaliar alguém também já é avaliar!) Que outra forma de "valorizar" o aluno que frequentou um curso regularmente em descrédito daquele que não frequentou? É sabido que nem todo aluno que frequenta integralmente um curso qualquer tem melhor aproveitamento do que outro que frequentou metade do mesmo curso, mas ainda assim essa questão não é satisfatoriamente respondida na teoria da educação libertária de Tragtenberg e por isso é pesquisa em aberto.


Referências:

DEMO, Pedro. Mitologia da Avaliação. São Paulo: Autores Associados, 2002.

GADOTTI, Moacir. História das Ideias Pedagógicas. São Paulo: Ática, 2005.

TRAGTENBERG, Maurício. Memórias de um Autodidata no Brasil. São Paulo: Escuta, 1999.

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